quarta-feira, 14 de outubro de 2009

alheava (2)

ainda a falar do trabalho alheava

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Uma das coisas que mais me impressiona é a dosagem do tempo. Não me lembro, agora, de ver nada parecido em literatura. Talvez o Boitempo, do Drummond, três livros publicados durante onze anos / também neles a memória. Mas nunca li nenhum deles com atenção para dizer.

Dez anos é o tempo há que Manuel Santos Maia realiza o seu trabalho.

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O Maia mistura objetos pessoais e públicos num mesmo espaço de afeto / num mesmo espaço de exposição. Onde se reúnem fotos de família, móveis da avó, notas de dinheiro, mapas.






É da história comum de Portugal e Moçambique. Essa miscelânea de registros / na memória não há espaço para avareza. Sobre a memória, Ecléa Bosi escreve num ensaio

Existe, dentro da história cronológica, outra história mais densa de substância memorativa no fluxo do tempo. Aparece com clareza nas biografias; tal como nas paisagens, há marcos no espaço onde os valores se adensam.

(...) A sociedade industrial multiplica horas mortas que apenas suportamos: são os tempos vazios das filas, dos bancos, da burocracia, preenchimento de formulários...

(...) Se a substância memorativa se adensa em algumas passagens, noutras se esgarça com grave prejuízo para a formação da identidade. É grave também nesse processo o ofuscamento perceptivo, ou melhor dizendo, subjetivo, uma vez que afeta o sujeito da percepção.

As coisas aparecem com menos nitidez dada a rapidez e descontinuidade das relações vividas; efeito da alienação, a grande embotadora da cognição, da simples observação do mundo, do conhecimento do outro.

Desse tempo vazio a atenção foge como ave assustada.

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Em alheava, a substância memorativa não se adensa à revelia dos macropoderes com seus trâmites impalpáveis, mas juntamente a eles. Como nos exercícios de matemática coloridos com lápis de cor, os despojos de oficialidade que os governos derrubam sobre a nossa memória são ressignificados e entram nas veias das nossas lembranças de um modo que, talvez, a máscara da alienação não seja capaz de sustentar.

Insisto no afeto.

No afeto, a alienação das horas mortas / das imagens mortas / pode adquirir significados imprevistos.

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(esses posts estão sendo escritos a duras penas e impressões parcamente concatenadas. Eu agradeceria muito alguma ajuda, viu)

2 comentários:

  1. eu tô adorando
    (precisa de ajuda não)

    :D

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  2. tem algo de nietzscheano nessa proposta com a memória

    de ter jogado fora a estrutura do ressentimento

    também não tem essência, é (re)(a)presentação,


    existe é criação a partir do agir

    "a poesia é uma arma carregada de futuro"

    voltada então ao passado que nunca é, também, passado.

    *

    concordo completamente com a parte do afeto.

    *
    etc.

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