quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Areia nos dentes, de Antônio Xerxenesky. Confissão de leitura

Comecei a ler deu desgosto no estômago.

"E os mortos voltarão à vida", exclamou o xamã na noite, e seu grito ecoou e foi ouvido. O céu estava particularmente belo, em tons arroxeados com nuvens esparsas e finas fatiando a lua.

E havia o medo. Havia o medo em todos os cantos. Hoje em dia, os homens temem bobagens; outrora, temiam a noite e a morte. Não importava a arma no coldre.

"Exclamou na noite", "o céu belo", "a marquesa aceitou o chá", "E havia o medo. Havia o medo". Nas primeiras linhas a gente percebe: é uma paródia, uma emulação de faroeste. Isso a capa já havia dito. Eu é que começo cada livro esperando encontrar X Grande Escritorx da Minha Geração.

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Depois de poucas horas, já havia lido mais da metade do romance. "É um nada", pensei. Em nenhum momento levantei os olhos do livro para estranhar as palavras.

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Ao final da leitura, percebi que estava me divertindo. Apesar de nos últimos capítulos o livro assumir de vez um recurso didático de ficar se justificando, se explicando à guisa de metalinguagem, coisa que aparece no livro inteiro. Mas eu me divertindo.

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Me ocorreu que, não só na poesia, mas também na prosa. Diversão tem sido uma constante. Pensei na presença do folhetim no século XIX. Alexandre Dumas, José de Alencar. A "alta literatura" produzindo entretenimento.

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Se o buraco negro é o paradigma da leitura. Perder-se no vácuo. Uma literatura da alienação, a grande do século XX? Kafka, Lispector, Faulkner. Mesmo noutra linha. Bukowski, por exemplo. Alguém sempre te chuta as muletas.

Agora: não será também isso datado? Essa uma literatura netunoplutoniana, talvez uraniana (netuno as névoas, plutão a morte, urano a ruptura, os três planetas descobertos de 1781 pra cá). E agora, Plutão deixando de ser planeta, nós num tempo sem profundidade escura (o blablá do pós-moderno).

No entanto Dumas, Alencar. Saint-Clair das Ilhas. E "literatura" é um conceito romântico. Dante não tinha interioridade freudiana. Até o século XVIII, em grande parte, o que hoje a gente chama de literatura era reprodução de gêneros. A crítica é descritiva, a poética era prescritiva.

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Não sei.

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Divertido, sim, o Areia nos dentes. Isso é um problema?

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